Europa: Más condições de trabalho provocam onda de suicídios

Por Julio Godoy


Uma onda de suicídios na França e outros países europeus levanta sérios questionamentos a respeito das precárias condições de trabalho impostas por modelos autoritários de gerenciamento, nos quais apenas os resultados são levados em conta. Os suicídios também reforçam as conclusões da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de que as políticas de livre comércio deterioraram as condições trabalhistas em todo o mundo.


Na France Telecom, a maior empresa de telecomunicações da França, 25 trabalhadores se mataram nos últimos 18 meses. Só em outubro, se suicidaram quatro funcionários dessa empresa privada, com investimentos em várias partes do mundo. Em todos os casos, as vítimas haviam revelado que sofriam pressões insuportáveis no trabalho.


“Todos eles trabalhavam em setores da France Telecom notórios por seu clima trabalhista cruel. Não há lugar para a humanidade na empresa, aqui só os resultados importam”, declarou Patrice Diochet, dirigente do sindicato dos trabalhadores da companhia.


Antes estatal, a France Telecom foi vendida em 1998. Nos dez anos seguintes, sua direção eliminou 22 mil postos de trabalho e implantou uma política de rotação constante dos funcionários de níveis médio e baixo. Modelos semelhantes de gerenciamento dos recursos humanos se tornaram prática comum em várias das principais empresas da França.


Nos últimos meses, também se reportaram casos de suicídio em outras companhias do país. Diversos operários das fábricas Renault e Peugeot se suicidaram desde 2007, deixando cartas nas quais diziam que a decisão se devia às más condições de trabalho.


David, de 30 anos, se matou em fevereiro passado, após escrever uma carta qualificando seus três supervisores de “bastardos” que “sempre pressionam os trabalhadores”. “David foi morto pelo trabalho”, disse sua viúva, Nathalie.


A França registra o terceiro maior índice de suicídios ligados a motivos trabalhistas no setor industrial, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), após os Estados Unidos e a Ucrânia. A Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), maior central sindical da França, indicou que cerca de 400 pessoas se suicidam a cada ano no país devido a dificuldades relacionadas ao trabalho.


Na France Telecom, o gerente Didier Lombard falou inicialmente de “uma moda de suicídios”, descrevendo as mortes como “coisas que acontecem”. A pressão política sobre a empresa levou à exoneração do subgerente Louis-Pierre Wenes, que havia acusado os sindicatos e a imprensa de “manipular e dramatizar em excesso” a onda de suicídios, por motivos políticos.


Em conseqüência dos protestos, a France Telecom suspendeu o sistema de rotação de cargos. Também instalou cercas nos tetos e grades nas janelas de seus edifícios mais altos para reduzir a quantidade de suicídios.


O ministro do Trabalho, Xavier Darcos, assinou um acordo com os sindicatos para promover um plano nacional contra o estresse nos locais de trabalho. Darcos advertiu que o ministério multará as empresas com mais de mil funcionários que não sigam o plano de prevenção. A primeira sanção será a publicação de uma lista das companhias que não obedeçam as novas diretrizes.


Psicólogos e dirigentes sindicais de outros países europeus também alertam sobre um aumento do estresse nos ambientes de trabalho. “Os suicídios devido a condições de trabalho precárias e estressantes não são um fenômeno exclusivamente francês. Pelo menos 27% dos trabalhadores da União Européia (UE) consideram que sua saúde e segurança estão em risco devido ao trabalho”, declarou Laurent Vogel, que investiga a saúde trabalhista no Instituto Europeu de Sindicatos, sediado em Bruxelas.


“Em toda a Europa ocorrem suicídios nos locais de trabalho, mas estes não aparecem nas estatísticas trabalhistas”, acrescentou. Segundo Vogel, “admitir o suicídio no trabalho é tabu, porque questiona a constante busca de maior produtividade e eficiência”.


A Alemanha não dispõe de estatísticas sobre suicídios nos ambientes de trabalho. “Mas muitos sindicalistas me disseram que estes também ocorrem com freqüência no país”, disse Dieter Sauer, professor de ciências sociais na Universidade do Exército em Munique. O professor Michael Schumann, da Universidade de Göttingen, afirmou por sua vez que “o novo mundo trabalhista está marcado por uma crescente crueldade contra o indivíduo”.


De acordo com o psicólogo François Desriaux, também editor da publicação francesa “Santé & Travail” (Saúde e Trabalho), “se as empresas modernas querem realmente abordar o problema (dos suicídios causados pelo estresse trabalhista), não precisam examinar os trabalhadores; é o trabalho que necessita ser diagnosticado”.


Os novos modelos de gerenciamento de empresas e recursos humanos, cujos únicos parâmetros são a alta produtividade e a eficiência, levaram “tanto os trabalhadores como as empresas a um beco sem saída”, ressaltou Desriaux.


“Para solucionar a crise, não é suficiente limitar os danos, procurando cuidar dos trabalhadores mais frágeis. A prioridade deve ser redefinir o significado de um trabalho bem feito, levar a cabo uma revolução no gerenciamento das organizações corporativas e de pessoal”, constatou o psicólogo.


Tradução: Dilair Aguiar

Nenhum comentário: