Guadalupe: A greve geral comentada por um de seus líderes





Com uma greve geral unida e firme, que durou 44 dias, os trabalhadores de Guadalupe conquistaram um acordo atendendo suas principais reivindicações, incluindo um aumento de 200 euros no salário mínimo (ver Greve geral em Guadalupe é vitoriosa). Elie Domota, secretário-geral da União Geral dos Trabalhadores de Guadalupe (UGTG) e porta-voz da Liyannaj Kont Pwofitasyon ( Aliança contra a Exploração – LKP) fala a Robert Fabert, da ILC International Newsletter, sobre o vitorioso movimento.







ILC: Qual é sua avaliação da greve?




ED: Ela teve um saldo muito positivo. Presenciamos 44 dias de greve geral total. Foi uma grande demonstração de unidade de todos os trabalhadores e de todas as organizações que integram a LKP.
Antes dela, muito disseram que seria um negro konplo um sé konplo chyen (uma conspiração de crioulos, uma conspiração de cães) ... Bem, nós demonstramos que podemos unir sindicatos, organizações políticas, associações de moradores, entidades de consumidores, movimentos culturais. Foi nossa diversidade que forjou a unidade.
ILC: Como a LKP surgiu e qual foi o seu papel no movimento?




ED: Como a LKP começou? Bem, foi muito simples: antes, cada organização atuava sozinha. Em novembro do ano passado, na UGTG, decidimos nos reunir com as outras organizações, depois do surgimento de uma série de problemas. Nós achávamos que nenhuma organização poderia ter sucesso em uma luta isolada; precisávamos de uma ampla unidade.
Foi relativamente fácil nos reunirmos, porque durante seis anos tentamos montar o que chamamos um programa de reivindicações da classe operária. Nós também estivemos juntos no 1º de maio. Mas, durante todo esse tempo, fomos incapazes de chegar a um acordo.
A 5 de dezembro de 2008, fizemos o primeiro encontro com os sindicatos, com sindicatos da educação, movimentos culturais, com partidos políticos ... E então a liyannaj (aliança) germinou! Houve a greve de 16 e 17 dezembro. Fomos à Prefecture de Basse-Terre (sede do governo francês) ... e decidimos continuar o movimento em janeiro.
A LKP foi criada deste modo. Nesta balan (dinâmica), escolhemos nossas cores, nossa bandeira e um novo hino. A Gwadloup sé Tannou (Guadalupe é Nossa) era cantada em coro por todos os manifestantes ... Ela decolou adan balan (muito depressa). A LKP é o fruto da unidade iniciada há muitos anos entre as organizações.
ILC: Guadalupe nunca será como antes, dizem os trabalhadores, militantes ... Você concorda? O que isso significa para você?





ED: Concordo. Mas quero dizer que não atuamos aos trancos e barrancos, no impulso. Devemos manter alguma regularidade e consistência em todas as nossas ações, se não quisermos cair no mesmo sistema que condenamos.
Acima de tudo, isto significa mudar as relações sociais, estabelecer novas relações sociais, novas relações entre homens e mulheres do nosso país. E, acima de tudo, as relações sociais nos locais de trabalho. Nós, os indígenas e negros, que somos maioria neste país, devemos sentir orgulho e parar de baixar nossas cabeças, aceitando o inaceitável.
ILC: O que este movimento simboliza para os povos e os trabalhadores de todo o mundo?



ED: Pode simbolizar o fato de que são as grandes lutas que fazem girar a roda da História. Hoje, o grande capital internacional controla tudo, inclusive os políticos que aplicam suas ordens. Conseguimos demonstrar que uma pequena nação de 400.000 habitantes pode desafiar este sistema baseado na exploração e submissão.


ILC: Você está sendo processado por “incitação ao ódio racial” e “extorsão de assinaturas no Acordo Jacques Bino”.
ED: Isto é uma tentativa de difamar o movimento: as palavras não foram racistas (1). Elas refletem uma realidade, a organização da sociedade em Guadalupe, que sempre foi, e ainda é, baseada em uma relação de raças e classes por nanni nannan (há muito tempo). O topo da pirâmide é sempre o mesmo: békés (elite branca), e, na parte inferior, o negro e o índio. Depois de 400 anos, ainda vivemos em uma fotocópia da mesma sociedade escravocrata.
A verdade é que ainda estávamos em greve nas companhias que não aceitaram o Acordo Bino (2), nós exigíamos o cumprimento do acordo ... E o que o promotor fez? Abriu um inquérito sobre “extorsão de assinaturas” no acordo. Isto, repito, é uma tentativa de nos enlamear, nos demonizar, de reverter as conquistas que fizemos.
Estamos prontos e não nos intimidaremos com processos! Se isto chegar ao tribunal, ele será um fórum para expor ao mundo inteiro o que é a nossa sociedade, o que o Estado francês faz em um pequeno país dominado.



(1) Entrevistado na televisão a respeito da recusa de alguns empresários em assinar o acordo, Elie Domota afirmou: “Ou eles cumprem o acordo, ou terão de deixar Guadalupe; não permitiremos que um bando de békés restaure a escravidão”.
(2) Jacques Bino: ativista sindical assassinado a tiros na noite de 17-18 de fevereiro de 2009, durante a greve geral.


Tradução: Dilair Aguiar

Fonte: Union Book


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